22 de setembro de 2012

As Personas e as características das relações sociais que tornam o Facebook deprimente e viciante


Personas são personalidades que você e eu assumimos nos diferentes ambientes com diferentes pessoas. Nada de errado até aí – nenhum ser é unilateral e exigir um padrão fixo de comportamento é pedir de certa forma alienação: o ser tende ao que é variado. Precisamos nos adaptar a todo momento aos ambientes com distintos grupos sociais e, apesar de haver certa coerência de personalidade, tal adaptação sempre irá ocorrer e em nome da boa convivência exige criar personagens de si mesmo.
 Você é formado por muitos ‘’ eu’s ’’ e a maioria das pessoas, num exercício de auto-análise, mal poderiam responder com certeza a famosa questão do ‘quem sou’.
 Problemas nascem quando o ser multilateral se questiona. Bergman retrata com perfeição tal dilema em seu filme sugestivamente intitulado também de “Persona” e nos pergunta: poderia o ser conviver com a incerteza sobre si? Vale a pena se negar em busca do sucesso ou convivência?
 Em nome do convívio a sociedade se baseou em mentiras e também é em nome dele que o ser nega-se criando facetas influenciadas antes pela adaptação do que surgidas por decisão.
 É nessa crise contra a artificialidade que entra o “eu sou” e mais uma questão moral se mostra claramente. O que é natural e necessário é em principio e por definição algo que nega o ser social, como tudo mais que as relações exigem.


Mas foda-se, e aí? Pergunta o leitor mais ansioso e de modos impacientes.

Ora, as relações humanas se dão por intermédio de personas desde que foi preciso uma convivência social de uma mesma pessoa com distintos grupos e a tecnologia, essa benção com que nos amaldiçoaram, trouxe mais que conforto – seus aprimoramentos técnicos possibilitaram uma expansão comunicativa jamais vista. A humanidade passou sua história com uma comunicação limitadíssima e em poucos e recentes anos um crescimento exponencial mudou-a mais intensamente que milhares de anos de titubeante crescimento. Isso é coisa conhecida por todos e cansativamente revisitada: a internet conectou o mundo e iniciou uma era de aproximação inigualável e, na própria internet, grandes marcos inventivos tornaram-na mais eficiente (Google, youporn, MSN, etc).
 Dentro desse  mundo recém inaugurado surge uma ferramenta sem precedentes no que tange a sua força e aceitação e que não só altera a maneira das pessoas se comunicarem, mas também evidencia traços da natureza humana e de como ela se relaciona com seus semelhantes, traços provavelmente milenares.
 Onde termina o que é relativo a natureza geral humana durante a história das sociedades e o que essa ferramenta de fato altera e cria? Bem, dessa matéria que trata o texto e é o que dissecarei nas linhas subseqüentes conforme o limite do meu intelecto e o formato ‘blogueiro’ permitirem.

O Facebook

Eis a ferramenta em questão. Certo é que muitas outras redes sociais relevantes surgiram antes deste e o influenciaram, mas é nele que o mais alto nível de interatividade humana até aqui foi atingido.
 Demonstrar sempre foi atitude repetida por nós humanos durante toda nossa existência. Estar sem demonstrar soa sem sentido. Estar feliz, triste ou bolado acarreta em demonstrar felicidade, tristeza ou bolação. Com o Facebook a demonstração é mais que pura informação e vira um hábito interessante. As pessoas escancaram sua rotinas buscando demonstrar desesperadamente, mas por quê? Observa-se que no Facebook nasce um caminho inverso. Estar deixa de ser o primeiro passo para demonstrar, assim a demonstração ganha vida própria e realiza o ser por si só. Mostrar basta: tal ferramenta dá o poder do homem divulgar a imagem que quer de si, disseminar como quer ser visto. Criar uma imagem pública é prática antiga, mas o poder de qualquer cidadão comum fazê-lo é o que essa ferramenta mais trás de novo.
Se ganha vantagens óbvias com uma melhor comunicação, mas perde-se a proteção que havia com a incomunicabilidade e torna-se vulnerável a esse mar de demonstrações duvidosas de pessoas querendo se afirmar para outrem como meio de contentar a si. É aí que nasce um dos males da convivência social: A comparação.

Comparação

 O ser humano a todo instante se compara. Isso é meio de se alegrar e mais ainda de se entristecer. Quando você está fudido na vida e surge alguém dizendo: Ao menos você tem saúde, tem gente que nem perna tem!!!
Existir alguém em pior situação não faz da sua boa. Comparar ruim com péssimo não elimina a dificuldade das duas situações. Fica claro que ver alguém pior é coisa suficiente para o homem sentir certo conforto, e tal sadismo que diz muito sobre a índole geral. A comparação com indivíduos em pior estado é uma maneira de justificar sua própria mediocridade, atitude comum das classes médias que dessa maneira homologam seu modo de vida.
O contrário também é comum – o ser se compara com quem considera superior e aí é que nasce parte de sua tristeza: ver o sucesso de quem o cerca ou está acima o deprime, não necessariamente por inveja gratuita, não estamos tratando aqui de simples pecados, mas de aspirações humanas. Sentir-se de alguma maneira para trás, ver realizações alheias e compará-las a sua estagnação. A felicidade é vista como medida e se vale da comparação para impor um padrão.
 Voltamos agora completos em conceitos para tratar do Facebook mais uma vez. Comparações, personas e demonstrações – ele as potencializa e altera. As pessoas explicitam situações divergentes, que não correspondem a sua realidade ou estado de espírito e o fazem constantemente. A rotina de demonstrações é o desabafo do ser, formar idéias nas pessoas sobre si, repito, é tentador: ao maximizar o poder de construção de imagem é que nasce o prazer, combustível do vicio.
 Já “Stalkear” (tornar-se obcecado pela vida alheia e vigia-la, persegui-la) é o hábito que deprime, ver a demonstração que gera a comparação. Frisava Adam Smith o constante exercício humano de se colocar no lugar de outrem, exercício esse onde nasce diversos sentimentos, tais como a compaixão ou altruísmo. Nele nasce também a depressão social e a falta /necessidade/desejo do que não se tem.
                                                                                                                   
  (Esquema de Justificação – maneiros são maneiros, medíocres invejam os maneiros e se justificam graças aos desgraçados, estes últimos fumam crack)

A Crise da Opinião

Existe a ideia de que ter opinião é algo positivo. “Tenha opinião própria” dizem por aí. Mas e se a opinião é imbecil ainda sim é relevante? Do que vale ter opiniões de assuntos que você não domina? É defender burrices e confirmar sua ignorância. Ter uma opinião pura e simplesmente pra ostenta-la é extremamente pouco e nada há de se gabar nisso se a opinião em nada tiver de qualidade.
 O Facebook se torna também aí, não só lugar de demonstrações, mas de opiniões sem base ou sentido, masturbações mentais de gente que quer se impor de qualquer jeito. As opiniões foram sempre, em sua maioria, fruto de pouca ou nenhuma reflexão e agora formam essa torrente de lixo online atual. As pessoas exigem que você saiba o que elas “acham” e argumentam em defesa de seus preconceitos.
 A construção de imagem que o Facebook possibilitou marca o inicio de uma era de relações humanas jamais vista: o contato frequente das pessoas potencializa e deixa visível características de maneira inigualável e vem acompanhada de consequências que nós, que vivemos tal transição, testemunhamos com vício e espanto.
Viver em sociedade é em muito se negar e a qualidade da vida social exige muito da capacidade de se contradizer. Resta saber se o homem poderá mudar ou se deixar de pensar e se incomodar é o melhor remédio dessa vida social nociva ao individuo.


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